Na madrugada de 25 de abril de 1974 preparava-se a Revolução de 25 de Abril, também conhecida como a Revolução dos Cravos, que viria a terminar o regime ditatorial do Estado Novo.
Houve vários eventos relacionados com a Bolsa de Valores que se sucederam após a Revolução. Escrevo este artigo para contar algumas curiosidades relacionadas com a bolsa portuguesa e esta data tão marcante para Portugal.
No período que antecedeu a Revolução dos Cravos, a Bolsa portuguesa vivia um período dourado. Em 1973 havia 145 empresas cotadas! Só as 10 maiores empresas cotadas equivaliam a cerca de 10% do PIB nacional. Números impressionantes!
Na altura, a negociação de ações era feita no Torreão Sul da Praça do Comércio, onde poucos corretores (pessoas que fixavam os preços das ações e facilitavam as negociações, “casando” as ordens de compra e venda dos investidores) faziam um trabalho verdadeiramente impressionante para a época.
Isto apesar de, segundo relatos de alguns investidores da época, a desorganização tremenda que imperava naquela praça de negociação. Os negócios eram feitos num quadro, sem grande regulação ou seriedade.
Nesta época, ao contrário do que se poderia pensar, nem só os mais privilegiados negociavam ações. Também a classe média e a classe média-baixa o faziam. E com grande volume: em 1973 chegavam à Praça do Comércio entre 2 mil e 3 mil ordens por dia só de clientes do Banco Totta e Açores. Um número que viria a cair para 50 ordens por dia em 1987.
Chegou o dia da Revolta e a Bolsa de Valores não abriu. E também não abriu no dia seguinte. Nem na semana seguinte. Nem no mês seguinte. Durante o resto do ano de 1974 a Bolsa manteve-se completamente fechada. Só viria a reabrir em 1977.
Imagina a principal praça de negociação de títulos no país estar fechada por 3 anos. Os portugueses desesperaram. Alguns chegaram a perder 80% dos seus investimentos com este encerramento da bolsa.
Muitos investidores perderam fortunas, pois haviam investido com recurso a crédito. Outros perderam dinheiro porque não conseguiam negociar os títulos.
Outros perderam dinheiro porque tinham investimentos em ações de empresas da banca e de seguros que foram nacionalizas, o que causou um grande impacto económico. Em 1975 praticamente 70% da economia tinha sido nacionalizada. Muitos destes títulos de empresas nacionalizadas foram trocados por títulos do Tesouro a 20 anos, com um juro de 2%. Uma troca que se revelou ainda mais terrível quando a inflação, nesse período, ultrapassou os 15%! Imagina o dinheiro perdido.
Foi uma altura bastante delicada para quem tinha as suas poupanças investidas em empresas cotadas em Bolsa.
Seguiram-se mais nacionalizações de empresas privadas por parte do Estado, que retiraram de bolsa alguns dos maiores grupos industriais e empresas ultramarinas que tinham operações em Angola ou em Cabo Verde. Foi uma verdadeira dor de cabeça para muitos investidores que perderam dinheiro e houve até alguns suicídios a lamentar durante este período, associados a todos estes eventos económicos e financeiros.
De repente, muito pouca gente queria correr riscos e as poucas negociações que se fizeram depois de 1977 eram desordenadas (havia quem dissesse que se negociava em cima de capôs de carros). O 25 de abril tinha reduzido os investimentos na bolsa a praticamente zero. Algo que só recuperou no final dos anos 80, com a Lei Sapateiro – nome dado em honra ao homem que acabou com “as ações negociadas em cima do capô de carros”, José Luís Sapateiro. Este homem redigiu a legislação que marca definitivamente a modernidade do nosso mercado de capitais, tal como o conhecemos hoje. Foi uma figura crucial para trazer organização e método à negociação de títulos em Portugal.
Mais tarde, entre 1986 e 1988 houve uma série de Operações Públicas de Venda (OPV) que permitiram a dispersão de diversas empresas em bolsa sem qualquer critério. Dizia-se, nesta altura, que “bastava imprimir papel que o mercado comprava”. De repente, a euforia voltara, e as pessoas estavam dispostas a pagar qualquer preço por títulos que nem deviam existir. Tempos estranhos; mas a mente humana tem destas coisas!
Atualmente a negociação é bem diferente daquele tempo (é maioritariamente online) e há menos empresas cotadas na bolsa portuguesa do que havia em 1973.
Também considero que ainda há poucos investidores em Portugal. Estamos cá para mudar essa realidade.
Saudações lucrativas,
Frederico Santarém